Quantcast
Channel: Fantastic - Cultura na palma da tua mão
Viewing all articles
Browse latest Browse all 14888

TOGI - Capítulo 5

$
0
0



"TOGI"é uma web-série original, da autoria de Ricardo Reis, que conta a história de Tobias, Otávia, Guilherme, Ivã e Ivo,  seis estudantes de uma universidade lisboeta. Todos eles são bem diferentes, mas têm algo em comum: as suas escolhas irão mudar para sempre as suas vidas.

[AINDA NÃO LESTE O CAPÍTULO 3? CLICA AQUI]

CAPITULO 5
OTÁVIA
 
Se existia um grupo de professores que estavam na sala de aula há hora que a aula começava o professor de Analise de infra-estruturas ambientais não estava de algum modo inserido. Estava sempre atrasado e a desculpa era sempre a mesma, o trânsito. O problema é que o professor apanhava apenas o metropolitano como muitos alunos podiam constatar e aí ainda não existiam congestionamentos. Tresanda a álcool, pensou Otávia quando ele se aproximou deles. E depois os alunos é que são os bêbados que só queriam festas. Embora o professor tivesse uma idade um pouco mais avançada as suas aventuras na noite eram de conhecimento geral. E com ressaca e aquela hora da manhã o resultado não podia ser nada mais, nada menos do que ninguém perceber nada de nada.

Outubro já tinha chegado mas o calor ainda era abrasador. Tão abrasador que o professor a cambalear foi ligar a ventoinha velha que se encontrava no tecto. 

- Não ligue no máximo se não a ventoinha ainda nos leva o telhado do barracão! – Brincou Ivo com o professor.

Mas se o tecto voasse Otávia nem ia notar. Estava tão concentrada naquele cartão de Fernando que não pensava noutra coisa. Por um lado tinha receio que aquilo a levasse por caminhos menos fidedignos, para algo mais negro, mas por outro lado sentia-se tentada a ligar ao homem. Tobias dera-lhe confiança, não sabia porquê mas sentia uma grande confiança nele e se ele a aconselhara a ir, porque não.

Tobias achou por bem ir com ela. Depois de telefonar a Fernando e de ele lhe dar o endereço apanharam o autocarro e pararam na paragem mais próxima da rua onde o homem os esperava. Quando chegaram depararam-se com uma grande vivenda igual a tantas outras que preenchiam a rua. Tocaram à campainha e Fernando foi recebê-los à porta.

- Achei por bem trazer um amigo comigo, ele pode entrar? – Perguntou Otávia.

A resposta foi afirmativa e os três entraram para a grande moradia. Enquanto não chegavam à porta principal Otávia teve tempo de vislumbrar o Audi que se encontrava à porta da garagem. 

Foi com grande espanto que quando entrou na sala se deparou com Alexandre Domingues, o actor que tem tido um grande destaque na televisão portuguesa.

- O teu perfil é bom não só para a publicidade! Gostei da conversa que tivemos no bar e reparei que tens uma veia de actriz dentro de ti. Por isso pedi ao Alexandre para que cá viesse para fazer um casting para representação. Quem sabe um dia não tenhas sorte e contracenes com ele mesmo a serio?! – Começou Fernando por dizer.

Além de Fernando e do actor encontrava-se na sala um fotógrafo. A sala era grande e apenas tinha um sofá, uma grande televisão, um projector e um fundo verde. Esta casa não deve ser a sua moradia mas sim o local onde faz os castings. No sofá encontrava-se uma mini-saia vermelha e uma blusa branca, que Fernando aconselhou a vestir.

Depois de vestida, Fernando pegou num chupa-chupa que tinha no bolso e deu-lhe para a mão.

- Se não tivesse aqui um actor de renome pensaria que me estavas a tentar tornar na nova Erica Fontes!

- Otávia! Sempre com piadas, foi por isso que gostei de ti, quando te vi naquele bar com aquele vestido justo, aqueles saltos altos, aquele batom, sabia que eras a ideal. E o teu sentido de humor! Achei a mulher perfeita! Mas agora vamos ao que interessa. Abre esse chupa que te dei e imagina que vais fazer um anuncio de chupa-chupas. Quero ver como o chupas. Tenta fazê-lo da forma mais sensual que conseguires. 

Achou o pedido de Fernando um pouco descabido. Olhou para Tobias e viu que ele também estava um bocado desnorteado com a situação. Nunca pensou que num casting para modelo começasse com um chupa na boca. Os flashes da máquina não paravam enquanto Otávia tentava fazer diferentes poses. 

Quando as fotos terminaram o fotógrafo mostrou-as. Acho-as um pouco constrangedoras, mas não conhecia bem o mundo da moda nem da televisão, se calhar é normal porem-nos a fazer este tipo de coisas. Depois disso Fernando acedeu ao seu e-mail e mandou as fotografias para um endereço que disse ser do seu director.
- Agora vamos à parte em que entra o Alexandre. Vamos ver como te comportas como actriz. Vamos improvisar um bocado, o Alexandre é o mestre do improviso, ele começa com a deixa e tu continuas da forma como quiseres. Mas vamos ver como te comportas porque antes que ele diga alguma coisa vais chegar-te ao pé dele e apalpa-lo entre as pernas, depois esfregas-te nele e aí ele entra com os diálogos.

Isso era impensável para Otávia. Quando já ponderava desistir e ir-se embora Fernando e Alexandre soltam uma grande gargalhada.

- Calma Otávia, era uma brincadeira, não estamos aqui para encontrar uma estrela porno. – Fernando pegou num pequeno guião e deu-lhe. – Treina um pouco essa cena para ver-mos então como corre.
Decorou as deixas e o casting correu com normalidade. Foi apenas uma conversa entre um louco e uma psiquiatra. Se calhar fui mesmo louca ao ter aceitado vir até aqui. O Fernando acabou por receber uma chamada e ausentou-se do local enquanto os outros quatro conviviam. Alexandre tinha gostado de Otávia, pedindo-lhe até o seu contacto telefónico que ela lhe estava a dar quando Fernando retornara à sala.

- Bem Otávia, era o director que estava em linha. Ficas para jantar connosco, conversamos um pouco e depois ele vai querer encontrar-se contigo. 

Alexandre e Tobias foram embora e Otávia acabou por ficar a jantar sozinha com Fernando. Reparava que apesar de não ter mais de quarenta anos já tinha alguns cabelos brancos mas era um homem atraente. Usava um perfume que ela apreciava e a conversa que estavam a ter ao jantar até se tornara interessante. Até que o telefone voltara a tocar. O homem que a queria conhecer já a esperava, por isso tiveram de terminar de jantar rapidamente. 

- Antes de sairmos veste esta camisa e estas calças. O director tem de ver bem os teus atributos. Mas pelo que me pareceu no telefone vais ter sorte, ele ficou muito convencido com as tuas fotos. Como também mandei o contrato assinado por ti e por mim pode ser que hoje ele já te dê alguma proposta.
Deslocaram-se no Audi preto que estava à porta da garagem e foram para o centro de Lisboa. Pararam o carro ao pé de uma residencial.

- O director quer receber-me aqui?! – Otávia já nada entendia.

- Sim, ele não gosta muito de escritórios e esta pensão é bastante agradável e tem um bar com bom ambiente. Não sei quanto tempo pode demorar a vossa reunião por isso vou-me embora, logo te direi alguma coisa!

Otávia saiu do carro e deslocou-se até à pensão. Foi lá que vislumbrou um rapaz que se encontrava de costas mas mesmo assim ela logo o reconheceu.

- Tu? – Perguntou Guilherme quando a viu.

- O que fazes aqui? – Perguntou Otávia surpreendida ao vê-la.

- Ao olhar para ti e ver a forma como vens vestida, acho que faço aqui exactamente o mesmo que tu. 

– Respondeu-lhe com uma chave de um quarto na mão. – Mas vamos subir, não queremos alaridos por aqui.

- Eu não vou contigo a lado nenhum! 

- Vais! – Ordenou, agarrando-a pelo braço e forçando-a a entrar no elevador.
Rapidamente entraram no quarto. Era arejado, com vista para a ponte vinte e cinco de Abril.

- O Fernando tinha dito que a nova aquisição dele era mesmo boa mas quem diria que eras tu! Como é que ele foi desencantar a maior betinha da faculdade onde eu ando para este tipo de … serviços.

- Serviços?!

- Prostituição! De luxo. Eu não paguei 300 euros para agora ficar a ver navios. – Disse enquanto se aproximou dela e começou a roçar-se. 

Otávia já estava enojada com tudo aquilo mas ficou mais quando ele desceu as calças e tornou a roçar-se na sua perna. As lágrimas começaram a cair-lhe pelo rosto. 

- Que foi?! Acho que devias ajoelhar-te e começar o serviço! Será que sabes fazer um broche? É fácil! – Guilherme levou o seu dedo médio na boca e simulou o acto. 

Otávia não aguentou e saiu do quarto a correr. Apanhou o primeiro autocarro que conseguiu e foi até a casa da sua melhor amiga.

- Sei que é tarde mas não conseguia ir para casa! Estás sozinha? – Perguntou a madalena.
- Porque é que estás a chorar?

Otávia abraçou Madalena com todas as suas forças enquanto as lágrimas continuavam a correr-lhe pelo rosto. 

- Estás sozinha? – Voltou a questionar.

Madalena demorou mas respondeu com uma voz quase sumida: - Sim… estou sozinha. Os meus pais ainda estão fora. Agora contas-me o que se passou?

- Foi o Guilherme! O Fernando! O casting! Tudo! A minha vida está uma m***a.

De repente o telemóvel de Otávia começou a tocar. Como não tinha coragem de o tirar da mala a sua amiga fê-lo por ela. Era o Fernando. 

- Não quero atender! – Gritou.

- Atende! E põe em voz alta, quero saber o que se está a passar aqui!

Fernando foi tão persistente que Otávia finalmente atendeu. Concedeu o desejo de Madalena e meteu em alta voz.

- OTÁVIA! DEITÁSTE 300 euros ao lixo! – A voz de Fernando mudara completamente de tom. - O Guilherme é sem duvida o meu melhor cliente e tu fazes-me uma destas?

- Modelo, disseste que o casting era para modelo! E até tinha um actor de renome como poderia duvidar daquilo tudo.

- És ingénua demais Otávia! Mas isto não se pode voltar a repetir, não se pode repetir nunca mais!

- E não vai! Porque eu nunca mais te quero ver, nunca mais quero estar ligada aos teus esquemas. Esquece quem sou Fernando.

- Esquecer?! – Fernando soltou uma gargalhada. – Tu estás dentro de um jogo, um jogo perigoso Otávia e neste jogo ou vences o que significa que compactuas comigo ou perdes e para saberes o que te acontece eu vou-te mandar um vídeo da última rapariga que desistiu. Se não me disseres nada considero que estejas no jogo se não, sabes desde cedo o teu destino.

Pouco depois de desligar Otávia recebeu uma mms. No vídeo aparecia uma rapariga a gritar, tinha o sotaque brasileiro. Estava presa numa espécie de jaula numa sala escura. Depois do vídeo Fernando ainda escrevera uma mensagem “Está a morrer de fome e assim há-de ficar até ao fim dos seus tempos. Sabe demais tal como tu! Não posso correr riscos disto cair para fora”.

Otávia continuou a chorar e começou a contar finalmente o que se estava a passar. Até que algo caiu na cozinha.

- Disseste que estavas sozinha!

- E … estou. Deve ter sido o vento, deixei a janela aberta.

Quando acabou de contar a sua história a Madalena pediu para ficar a dormir ali por aquela noite, mas primeiro queria usar a casa de banho. Subiu as escadas que levavam ao primeiro andar da casa da sua amiga e dirigiu-se para a casa de banho que se encontrava ao fundo do corredor. Ligou a água da banheira e despiu-se. Queria-se lavar, sentia-se suja. Suja por fora e por dentro. Com a esponja raspou as pernas enquanto se lembrava de Guilherme. Embora já se tivesse lavado várias vezes continuava a sentir-se suja e sobretudo perdida. Não queria acabar como aquela rapariga do vídeo mas também não queria continuar a ser uma acompanhante de luxo. Isto é um jogo, as palavras de Fernando ecoavam na sua cabeça. Se isto é um jogo eu ainda posso vencer, só tenho de aprender a jogar. Mas como, como vencerei aquele que parece invencível sem conhecer nada do que ele é realmente. E ficou ali na banheira uma eternidade tentando recompor-se mas não conseguia, sempre que se lembrava da pensão e de Guilherme nu do tronco para baixo que as suas lágrimas voltavam a cair.

Viewing all articles
Browse latest Browse all 14888