
CAPITULO 27
IVÃ
Faltavam poucas horas para um novo ano começar. Era um ano em que Ivã pensava finalmente triunfar. Era um ano em que esperava não ter de esconder mais a sua vida. Um ano em que finalmente poderia andar de mão dada com Lilia na rua enquanto o seu filho corria para os seus braços e ele pegava-o ao colo. Era pelo menos o desejo de Ivã para esse ano e pela forma que as coisas estavam a correr tudo indiciava a que as coisas corriam nesse rumo. Por essa razão a comemoração do novo ano iria ser diferente daquela vez. Ivã via Lilia cada vez mais depressiva, cada vez mais fechada no seu pequeno mundo, então decidiu viajar com ela para o Algarve. Lilia já não saia de casa desde que lhe dera a notícia que estava grávida, isso há sete anos atrás. Era altura de se divertir um pouco, e com tanto movimento ninguém ia dar por ela, ainda por cima passados tantos anos.
Fizeram as malas e meteram-se no carro rapidamente sem darem muito nas vistas. Ainda não era altura de Lilia ser vista por toda a gente, isso estaria reservado para mais tarde, algures no ano que estava prestes a iniciar-se. Demoraram algumas horas para chegar, um pouco mais que o habitual devido ao tráfego que apanharam pelo caminho. Parecia que naquele fim de ano todos se dirigiam para o Algarve. Enquanto viajava Ivã observava Lilia. Estava a passar as fotos do seu filho. Tinha um brilho nos olhos sempre que olhava para elas e acabava sempre a chorar. E aquela vez não foi excepção.
- Não, hoje não é dia de chorar é dia de comemorar o novo ano que se avizinha. – Ivã aumentou o som do rádio do carro e começou a cantarolar, o que fez Lilia soltar um pequeno sorriso. – Eu sei que se conseguisses falar me dizias para calar porque canto mal para caraças, mas sei que gostas de mim assim.
Lilia voltou a esboçar um sorriso nos lábios e depois voltou a ficar triste. Pegou no seu caderno e escrever “Queria que ele estivesse connosco!”. Quando Ivã teve oportunidade de ler o que ela escrevera.
- Eu também queria, mas sabes que não é possível por agora, mas para o ano eu prometo-te que o teremos aqui no carro e ele passará o ano connosco! Eu prometo-te.
Chegaram ao Algarve ao anoitecer. A cidade de Portimão estava cheia. Dirigiram-se a um hotel que estava lotado. Lilia nunca tinha estado num hotel e estava radiante.
- Tive de reservar o quarto com dois meses de antecedência vê lá tu! E quase que não tínhamos reserva. – Disse-lhe quando entraram no quarto.
Ivã sentiu um pouco de medo, assim como Lilia, de que ela fosse reconhecida como a rapariga desaparecida de há oito anos atrás. Mas isso não acontecera. O seu desaparecimento já se dera há tempo suficiente para uma jovem rapariga como a recepcionista se recordasse da sua imagem.
Lilia pegou no seu caderno e escreveu “Estou a gostar de cada momento que passo contigo aqui”
- E eu também! – Respondeu-lhe de imediato.
Ivã vivia para Lilia como Lilia vivia para Ivã. Os dois tinham sido feitos um para o outro. Lilia fora a primeira namorada de Ivã, tinham ambos catorze anos. Ivã era um rapaz bastante solitário até conhecer Lilia. Ela era diferente de todas as pessoas que conhecera. Era uma rapariga que não fazia troça dele por gostar de ler e não saber jogar à bola como faziam os outros colegas. Se já eram cúmplices na adolescência o ter de esconder Lilia durante oito anos tornou-os ainda mais íntimos. Agora era impossível viverem um sem o outro. Sem Lilia a vida de Ivã já não faria sentido assim como a de Lilia não faria sentido sem Ivã. Eram o porto seguro um do outro.
- Veste aquele vestido que te comprei para irmos jantar.
Quando Ivã a viu com aquele vestido vermelho que lhe comprara nem tinha palavras para a descrever. De braço dado entraram no restaurante do hotel que tinha um enorme requinte. Ficaram com uma mesa com vista para a Praia da Rocha que naquela altura já estava preparada para receber uma grande quantidade de pessoas para celebrarem a vinda do novo ano.
Enquanto jantavam Ivã olhava para os brincos que Lilia trazia. Aqueles brincos tinham sido o primeiro presente que ele lhe dera quando fizeram dois meses de namoro. E Lilia usava-os com frequência principalmente nas ocasiões especiais e aquela era uma dessas ocasiões. Os seus olhos também cintilavam como não cintilavam há anos, talvez desde o dia em que teve o pequeno Daniel nos seus braços, antes dele o ir colocar junto à porta dos seus pais.
- Estás a gostar de tudo isto? – Perguntou-lhe enquanto jantavam.
Lilia agarrou-lhe o braço e sorriu. Um gesto que valeu para Ivã mais do que mil palavras que Lilia não poderia expressar.
Quando terminaram de jantar faltavam apenas algumas horas para as doze badaladas. Por essa razão decidiram abandonar o hotel onde estavam hospedados e dirigir-se para onde se encontrava o cerne da diversão, a praia. E pelo areal foram de mãos dadas enquanto se ouvia uma música no palco montado na praia para a ocasião.
As tochas que se encontravam a iluminar o caminho foram suficientes para que Guilherme conseguisse ler a mensagem que Lilia escrevera no seu caderno. “O que sinto por ti é tão grande que se contássemos todas as estrelas deste céu estrelado não iria chegar para dizer o quanto gosto de ti!”
- Multiplica as estrelas todas que vês e a isso soma todas as pétalas de rosas que abundam por este país e poderás ter o valor do meu amor por ti! – Retribuiu-lhe Ivã para não ficar em desvantagem. E percorreram o caminho até à multidão, os dois de mão dada.
Quando chegou a meia-noite os dois entraram em euforia no novo ano. Assistiam ao fogo-de-artifício, levavam com um banho de champanhe que um grupo de jovens atirara para o ar e Ivã pediu o seu maior desejo, passar a ter uma vida normal.
