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TOGI - Capítulo 40

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CAPITULO 40
IVÃ
   
Só quando chegou à faculdade é que Ivã reparou que deixara as chaves em casa. Àquela altura não tinha tempo de voltar para casa por isso a única solução fora ligar a Lilia para que ela lhe abrisse a porta. Desde que Lilia morava em sua casa ela nunca abria a porta a ninguém a não ser a ele. Tinham um toque especial e ela só se deslocava da arrecadação para a porta de entrada se o toque fosse aquele que ensaiaram. Era muito perigoso para ambos que Lilia fosse descoberta, isso era um facto. Quando entrou na faculdade depois de fazer a chamada a Lilia achou estranho Guilherme não se encontrar nas instalações àquela hora. Nos últimos tempos Guilherme era sempre dos primeiros a chegar e sentava-se quase sempre a seu lado. Ivã sabia muito bem a razão, tal como Otávia lhe dissera ele andava atrás de algo que o levasse à Lilia. Ainda bem que ele não está cá hoje, assim é impossível ter escutado a chamada que eu fiz, pensou para si um pouco descontraído.
    
Passavam poucos minutos do meio-dia quando as aulas de Ivã terminaram ele pensou em dirigir-se imediatamente até à sua casa mas a sua prima Madalena convenceu-o a almoçar primeiro. O dia ainda ia a meio e quando chegasse a casa era praticamente hora de sair para o trabalho o que significava que iria ser mais um dia sem tomar uma das refeições mais importantes do dia. Assim foram até à cantina e almoçaram. Com o estômago mais aconchegado Ivã estava preparado para ir até sua casa. Ainda tinha um longo caminho a percorrer até lá. Ivã morava numa urbanização nos subúrbios da cidade e só às vezes é que se deslocava para o GPO de automóvel, optando pela maioria das vezes por ir de transportes públicos por ser uma solução um pouco mais económica. O dinheiro que ganhava era pouco para despesas, não precisava de mais.
    
Quando chegou ao seu prédio abriu a porta da rua como sempre. Essa era fácil pois nos últimos meses que tem estado avariada e não fechava. Desceu as escadas e quando chegou à sua porta tocou três vezes à campainha como tinha combinado com Lilia. Achou estranho ela nunca mais vir abrir a porta. Lilia costumava demorar entre cinco a dez minutos para abrir a porta a Ivã, certificando-se sempre de que era ele que estava a tocar primeiro, mas naquele dia já se tinha passado um quarto de hora e nada, Lilia não chegava à porta. Foi então que tentou o seu toque especial mais uma vez. Sentiu-se mais tranquilo quando começou a ouvir a porta a abrir. Por vezes Ivã tinha medo que acontecesse alguma coisa a Lilia enquanto estava fora mas a porta estava a abrir por isso talvez ela estivesse ocupada a fazer alguma coisa e não tivesse ouvido os três toques da campainha da primeira vez o que a fez não se dirigir à porta de casa.
     
Quando a porta se abriu, e Ivã viu Guilherme com uma das suas mãos a agarrar o pescoço de Lilia e a outra com uma arma apontada à sua cabeça, sentiu um arrepio na espinha. Agora é que está tudo perdido, pensou desesperado.
    
- Vá, entra sem fazeres grande alarido. Não vais querer que os vizinhos saibam que tens aqui uma rapariga sequestrada pois não. – Disse Guilherme o mais baixo que conseguiu e Ivã obedeceu.
    
- Não lhe faças mal! – Suplicou Ivã ao vê-lo com a arma na mão desta vez apontada à nuca de Lilia.
    
- Fazer-lhe mal?! Ou Ivã, tu não me conheces? Eu iria lá agora fazer mal a uma grande amiga minha. Eu e a Lilia estivemos aqui a por a conversa em dia! Bem eu estive a conversar a Lilia apenas escrevia. Está em choque, sabias? Deve ser de estar fechada nesta casa há oito anos. Se fosse eu também ficaria, sabes. É uma casa um pouco sem cor e a arrecadação onde a obrigaste a morar é um pouco sem graça. Havias de ter chamado um decorador para decorar aquilo, está tudo velho e triste naquela divisão da tua casa, não admira que a Lilia esteja tão deprimida. Sabes, desde que eu cheguei aqui que só a vejo chorar. Ao inicio achei que fosse emoção por me ver, um amigo que não se vê há muito tempo pode causar esse tipo de sentimento numa rapariga, mas agora o que acho mesmo é que ela ficou depressiva por estar aqui. O que mais seria não é verdade?!
    
- O que queres afinal? – Perguntou Ivã. Sabia que ele tinha alguma coisa em mente mas não conseguia perceber o quê.
    
- Bem, já que estão tão empolgados não percamos mais tempo, também ainda não almocei e estou a ficar com fome. – Dizia Guilherme enquanto Ivã abraçava com força Lilia.
    
Guilherme levantou a arma e apontou-a ao casal enquanto o seu dedo estava a um passo de premir o gatilho.
    
- N… na… não! – Gritou Lilia de repente para espanto de Ivã. Pela primeira vez em oito ano emitiu um som da sua boca.
    
- Bem, eu faço milagres! Consegui pôr a Lilia a falar! Mesmo a tempo de dizer as suas últimas palavras. Tens cá uma pontaria minha grande amiga.
   
- N… na… não! – Voltou a gritar Lilia.
    
- Não precisas de ser tão repetitiva, já te ouvimos. Agora vá, acabou a brincadeira, estou a ficar um pouco aborrecido com tudo isto, eu canso-me facilmente de coisas aborrecidas.
    
Guilherme voltou a apontar a sua arma ao casal que se abraçava com força naquele momento inquietante que viviam. Ivã sabia que podia esperar de tudo de Guilherme depois de tudo o que o vira fazer, por isso estava com medo, com medo de morrer e com medo de perder Lilia. Quando Guilherme premiu o gatilho os seus olhos fecharam e agarrou as mãos de Lilia com força para que morresse com quem realmente amava. Mas quando abriu os olhos nada tinha acontecido.
    
- Oh meninos, já não se pode brincar, levam tudo a sério! Acham que vinha para casa de dois amigos com a arma carregada. Já tenho muito sangue nas minhas mãos, não quero mais. Eu só vim cá para vos propor uma oferta irrecusável. Se a recusarem é que o caso muda de figura, mas vocês são os dois inteligentes e sei que vão adorar a minha ideia e se isso acontecer eu prometo que nunca mais vão ouvir falar de mim.
   
- C…che…chega! – Declarou Lilia.
    
- Oh Lilia, agora que reaprendeste a falar não queres outra coisa! Mas agora cala-te um bocadinho para eu dizer o que aqui venho fazer. Como é óbvio não vos quero matar se não já o teria feito. Eu vim até aqui para testar o vosso amor! Saber se o Ivã está disposto a sacrificar a sua vida por ti. E como é que isto se vai fazer? Perguntam vocês, é muito simples. Eu vou fazer uma chamada anónima para a polícia a dizer que o pobre do Ivã sequestrou e manteve em cativeiro a pobre Lilia. Como será de esperar a polícia vem a correr ao local para verificar a veracidade do testemunho que recebeu por telefone e aí vai encontrar a Liliazinha a chorar que nem uma perdida e a falar mal devido ao seu estado de choque, foram muitos anos em cativeiro. E aí tu, Ivã, serás preso por um crime que não cometeste. Até parece que estou a ter um dejá vu, a tua amiga Otávia está a passar pela mesma situação que tu. Então que me dizem deste final?
    
Embora não dissesse nada Ivã estava a pensar no que acabara de ouvir. Percebeu que Guilherme estava tão louco que nem pensou no seu álibi do que se passara na serra de Sintra, se ele tivesse sequestrado Lilia quem tinha cortado os dedos e a língua a Gustavo? E mais, se ele tivesse sequestrado Lilia porque tinha esperado uma noite em que eles estavam juntos, e as cicatrizes nas costas não tinham qualquer fundamento credível. Parecia que Ivã tinha descoberto o ponto fraco de Guilherme. Não precisou de fazer muito para que Guilherme começasse a ficar desorientado. Mas tinha medo que a polícia não reparasse nesses pormenores mas não tinha outra hipótese se não ceder às loucuras dele. Se não aceitasse aquela opção bizarra poderia correr o risco dele ou Lilia ficarem feridos e isso era a última coisa que queria naquele momento.
    
O que custou mais a Ivã não foi sair do seu prédio algemado, mas sim ver de longe o reencontro entre Lilia e os pais. A mãe dela chorava mais do que Ivã já tinha visto e até o pai estava emocionado. O seu filho não estava lá o que lhe deu um aperto no coração, sempre imaginou que era no reencontro de Lilia com os pais que poderia dizer finalmente que o pequeno rapaz era filho deles e poderiam viver felizes para sempre, mas tal como dissera em tempos a Guilherme a vida não era igual a um conto de fadas e aquilo que se planeia poderia nunca vir a acontecer. Mas a maior dor que pôde sentir naquele dia surgiu quando a mãe da rapariga que acolheu durante os oito anos que passaram chegou perto dele e lhe deu um estalo.
    
- Seu porco, nojento! Sempre tiveste a minha filha aqui trancada enquanto nós te acolhíamos lá em casa! Cobarde, nojento. – Gritava a mulher enquanto dava pequenos murros no peito de Ivã que tentava conter as lágrimas mas não conseguia. Não era assim que queria que as coisas tivessem terminado na sua cabeça o único que ia preso era Guilherme mas esse estava a rir-se dele enquanto via todo aquele espectáculo.
    
Antes de entrar no carro da polícia viu Lilia cercada por jornalistas. Sabia que aquilo poderia acontecer mas ela odiava ser exposta e mais uma vez as coisas levaram a isso. O seu maior sonho tinha virado um pesadelo. Guilherme acumulava mais uma vitória. 

 
Não perca o 41º episódio, na próxima sexta-feira, para ler aqui no Fantastic e na página oficial do projeto, em www.facebook.com/pages/TOGI/277175702491216



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