TOGI - Capítulo 41

O GPO estava a começar a ser conhecido por todo o país e pelas piores razões. Primeiro Guilherme perdera o dedo médio no acampamento durante a visita à Beira Interior, depois Otávia fora presa por ter morto o director do canal ITV – Televisão interactiva e naquela altura Igor recebia a noticia que Ivã tinha sido preso por sequestro de uma das suas namoradas, mantendo-a em cativeiro durante oito anos. Como Igor já esperava uma série de jornalistas deslocaram-se até ao instituto para que algumas pessoas prestassem declarações sobre o comportamento de Ivã na faculdade, para saberem junto dos que lhe eram mais próximos como ele interagia com eles. O primeiro a querer prestar depoimento aos jornalistas foi Guilherme. Para as câmaras parecia estar bastante chocado e fragilizado com o que aconteceu mas para Igor aquilo não passava de um triste teatro. Guilherme nunca se preocupava com ninguém não iria preocupar-se com uma amiga que desaparecera há oito anos. O que impressionava mais Igor era o facto de ter sido Ivã a tê-la em cativeiro. Para ele o rapaz não era capaz disso, mas se as provas estavam lá quem era ele para refutar a verdade.
    

Estava um pouco nervoso. Era o dia em que fazia a primeira apresentação oral do esboço do seu projecto de final de curso. Já tinha apresentado aos professores algumas ideias mas nunca tinham contado para avaliação, mas naquele dia as coisas seriam diferentes, mas as atenções de Igor foram para a conversa de dois rapazes que se encontravam sentados ao lado de uma das salas do instituto. Não falavam do tema que todos falavam mas de um bem pior para ele:
    

- Estou a falar a sério, é mesmo a gaja que está toda nua na internet. Eu não conheço a Marília? Tenho aulas com ela todas as quintas-feiras conheço-a bem. Se quiserem mando-te o link com as fotos! – Dizia um deles.
   

Igor aproximou-se dos dois rapazes e questionou o que dizia ter visto fotos da sua ex-namorada na internet. O rapaz disse que se lhe arranjasse um computador com acesso à internet conseguia chegar ao site em que encontrou as imagens. Igor rapidamente tirou o seu portátil da mochila e o entregou ao colega que rapidamente abriu a página de internet onde Igor constatou que se tratava de Marília. Eram as mesmas fotos que tinha guardadas no portátil, que ela lhe enviara há uns meses atrás. Como é que elas foram ali parar? Perguntava-se sem conseguir obter uma resposta concreta. Foi nesse momento que Guilherme entrou na faculdade e como o viu agarrado ao computador foi ter com ele.
    

- Já viste? A tua ex-namorada é uma desavergonhada. Não se fala noutra coisa no instituto, quer dizer além do sequestro da Lilia. Esta faculdade realmente só tem escândalos, acho que o que fazia melhor era mesmo mudar de instituto, quando sairmos daqui nem emprego arranjamos com a fama que isto leva! Mas já agora queria dar-te uma palavrinha a sós Igor.
    

Igor levantou-se e seguiu Guilherme para perto da sala onde ainda não se encontrava praticamente ninguém.
    

- Gostaste da minha prenda? Nunca devias ter-me desprezado no trabalho de final de semestre. Ah e outra coisa, devias ter mais cuidado com o que guardas no teu computador pessoal, às vezes pode ser perigoso andares com fotos da tua amada nua no teu portátil. Não te preocupes eu agradeci e pelos vistos os rapazes que andam aqui na faculdade também. Tinhas uma namorada mesmo boa e deixas fugi-la. Pobre coitado Igor.
    

- Eu emprestei-te o meu computador com a melhor das intenções e tu fazes-me uma coisa destas? Que tipo de pessoa és tu? – Igor ergueu o pulso.
    

- Calma aí franganote, não partas para a agressão, ainda por cima com alguém que é capaz de te partir todo. Igor, vou contar-te um segredo, todos aqueles que se meteram comigo perderam e tu não foste excepção. Ainda pensei em não fazer algo tão mau, sei que tens andado doente, mas quando vi as fotos no teu computador achei que as devia de partilhar, fotografias de uma gaja assim não pode ficar só para ti, é egoísta da tua parte. E nos dias de hoje uma pessoa não pode ser egoísta, deve saber partilhar as coisas boas da vida com os outros. E já agora boa sorte para a apresentação de agora meu caro amigo.
    

Guilherme foi até fora da instituição para fumar um cigarro antes de entrar na aula deixando Igor sozinho, a pensar na sua vida. Sentiu palpitações. Não as sentia desde que tomava os comprimidos que a médica lhe tinha receitado, mas ele ainda continuava frágil e aquela surpresa desagradável estava a fazer com que Igor voltasse a ter os mesmos sintomas que tinha em outros tempos.
    

O seu colega de grupo começou por introduzir o trabalho na apresentação do projecto final. Era uma apresentação um pouco extensa e o Igor estava encarregue de apresentar a segunda parte dos slides o que ainda ocupava cerca de dez ou quinze minutos, mas ele não conseguia pensar no trabalho, cada vez que olhava para Guilherme que se encontrava ao fundo da sala sentia uma raiva tão grande dentro de si que as tonturas e as palpitações pareciam ser mais intensas do que antes. Como seria de esperar, quando chegou a sua vez na apresentação a oralidade de Igor não foi a melhor e os professores perceberam isso mesmo. Igor estava a tremer bastante e parecia cansado a falar, quando não se encontrava a gaguejar. Parecia bastante desgastado e sem confiança no que estava a dizer. No fim da apresentação os professores que o ouviram perguntaram-lhe se ele estava a par do trabalho que estava a apresentar pois parecia muito pouco convicto nas suas palavras o que levavam a crer que o seu colega tivesse realizado todo o trabalho apresentado, o que não era de todo verdade. Igor era um dos alunos mais aplicados que o GPO actualmente tinha e nunca deixaria que um colega seu fizesse um trabalho todo por si. Sabia o que isso custava, mas os professores sabiam que ele não era assim, e dado ao facto de atravessar uma crise de ataques de pânico que poderiam estar a afectar a sua prestação na cadeira, pediram que repetisse a apresentação juntamente com o seu colega num outro dia na mesma semana.
    

Mal acabaram as apresentações dirigiu-se para a rua. Queria ir para casa. Estava a ter um dia péssimo, mas que piorou quando se deparou com Marília nas escadas que davam acesso ao instituto.
    

- Como foste capaz? Tu não tinhas o direito de fazer aquilo que me fizeste! Eu nunca pensei que me fizesses uma coisa dessas. – Dizia Marília completamente furiosa.
    

- Não fui eu Marília, eu juro que não fui eu! O Guilherme! Ele mexeu no meu computador quando começou o segundo semestre e como eu não fiz o trabalho com ele vingou-se com as fotos. Eu sei que fiz mal em ter as fotos no meu portátil sei que as devia ter apagado, mas não fui eu.
    

- Agora queres desculpar-te com o Guilherme? Como é que eu vou aparecer na faculdade agora que todos viram aquelas fotos. Estou a morrer de vergonha e tudo por causa da tua falta de cuidado. Não te perdoou por isto Igor, não te perdoou!
    

Quando ouviu aquelas palavras saírem da boca da rapariga por quem suspirava todas as noites antes de dormir, Igor sentiu um aperto no peito. Sentiu o seu coração a pular tanto que parecia querer sair do seu peito. Recordou as palavras da médica em tomar um comprimido em caso de SOS e aquela parecia ser uma das situações a que ela se referia. Andava sempre com um comprimido no bolso das calças para o caso de precisar mas por azar naquele dia esquecera-se de o colocar. Não se estava a sentir bem. Começou a sentir as pernas a tremer assim como os seus braços e sentiu uma dor no seu peito. Via Marília a começar a ficar atormentada com o que estava a acontecer sem saber o que fazer, mas ele só conseguia pensar naquilo que estava a sentir. Sem saber como caiu de joelhos no chão e de ver um colega seu a levantá-lo.
    

Marília e o seu colega acharam por bem levá-lo até ao hospital e ele aceitou. Nunca tinha tido uma crise tão grande como aquela que tinha acabado de ter. O colega de Igor levou-o a ele e a Marília até ao hospital e seguiu para sua casa mas Marília ficou lá com ele. Não o queria deixar sozinho, não sem saber o que ele realmente tinha.
    

Quando entrou no consultório o médico que estava de serviço nas urgências do hospital perguntou o que o tinha levado até ali. Igor contou o seu historial. Apresentava-se ainda com o sistema nervoso bastante alterado. As suas mãos e pernas não paravam de mexer. O médico mediu a sua pressão arterial e encontrava-se um pouco alta, mas o seu ritmo cardíaco apresentava-se ainda mais elevado com o coração a ter cento e quarenta batimentos por minuto. Antes de continuar a sua consulta o homem encaminhou-o até à enfermaria para que lhe dessem uma vacina de forma a que a tensão arterial e o ritmo cardíaco estabilizassem. Quando voltou ao consultório Igor sentou-se e disse:
    

- Doutor, sinto um pouco de sono!
    

- Sim, é normal sentir-se assim. O que teve foi um ataque de ansiedade bastante grande.
    

O médico prosseguiu com a explicação do que lhe havia acontecido e explicou com auxílio das informações que Igor lhe deu que aqueles ataques não iriam passar sem fazer um tratamento que teria uma duração mínima de seis meses. Ao longo desses meses iria ser acompanhado por uma médica da ala da psiquiatria que iria ver a sua evolução ao longo do tratamento.
    

Quando chegou a casa olhou para os comprimidos que tinha de tomar. Leu nomes que nunca tinha ouvido falar na sua vida. Risperidona, Setralina, alprazolam iriam fazer parte do seu quotidiano nos próximos meses mas Igor só tinha uma preocupação, deixar de ter aquela doença e se esse era o único caminho que tinha para conseguir ultrapassar isso, ele fazia esse esforço.